A história que passo a contar é verídica.
O bonito subúrbio londrino perdera a sua paz. A população toda estava calma, mas o perigo era eminente!
A guerra mostrando-lhe seu horror, ameaçava destruí-la.
- Preciso mesmo partir, mãezinha?
O coração da pobre mãe apertou-se ainda mais ao ouvir estas palavras e ao olhar para Guilherme, o filhinho de seis anos, cuja pele era tão negra como a de seus pais.
Os cinco anos que passara na Inglaterra pacífica, longe do calor dos trópicos, não conseguiram tornar branca aquela epiderme macia. O pequenino se considerava diferente e inferior às demais crianças, quem sabe se porque estas, sem coração, lhe houvessem feito sentir a diferença de cor.
Havia chegado o momento em que as crianças tinham de ser enviadas para longe de seus pais, deixando a cidade ameaçada, para que suas vidas, fossem salvas.
Guilherme devia partir para talvez nunca mais se reunir à mamãe e ao papai, para os quais era tudo!
- Mamãe! Sou preto! Ninguém me há de querer! Deixa-me ficar aqui!
A infeliz mãe tomou-o em seus joelhos e disse carinhosamente:
- Filhinho! Tens de partir! Teu pai é agora soldado e eu sou enfermeira! Tua vida tem de ser guardada para que também um dia possas ser útil... O nosso Deus vai achar para Guilherme um outro lar e uma nova mãe! –
Sua voz não tremia diante do sacrifício!... Seu filho ia ter uma nova mãe!... Ela própria iria substituir outras mães nos hospitais de sangue! O filho que tanto amava ia deixá-la... Não mais escutaria a sua vozinha meiga, não mais receberia os seus beijos... Mas, que importava o seu sofrimento, a saudade que sentiria, desde que a vida do filho amado fosse salva!
- Filhinho, não te esqueças de Jesus!
Ora diariamente e pede a Ele que te guarde!
- Devo então partir mesmo e sozinho... Ninguém quererá receber um pretinho... O que devo fazer?
A resposta foi dada pelo pai de Guilherme que entrou na sala com um envelope na mão.
- Vou colocar este envelope no forro do teu paletozinho, meu filho. Não dirás a ninguém que está ali. Quando chegares ao teu destino verás que muitas pessoas irão receber as crianças e levá-las para as suas casas.
Espera que uma senhora sorria ao olhar para o teu rosto, sem recuar por ver que és um pretinho. Se ela disser que te vai levar consigo, pergunta-lhe: “A senhora tem certeza de que me quer?”.
Poderás ler a resposta em seus olhos e, se neles vires amor e carinho, segue-a e seja para ela um bom filho!
O menino seguiu, pois, com centenas de outras crianças, para um futuro desconhecido!
A notícia da chegada dos pequenos fugitivos se espalhara e a estação se enchera de senhoras que se prontificavam a adotá-los.
Em uma casa pequenina daquela cidade, uma senhora, vestida de luto, terminava o arranjo do modesto interior.
“Irei buscar um menino, dizia. Sou agora muito pobre! Meu marido e meus filhos dei-os à Pátria e entreguei-os a Deus! Estou só, mas com o meu trabalho sustentarei o novo filho que Deus me proporcionar”.
“Amá-lo-ei e seremos ainda felizes”.
O coração desta mãe havia também sofrido.
Seu marido e seus dois filhos fizeram-se aviadores e haviam morrido.
O seu amor materno, entretanto, não morrera: porque havia amado seus filhos amaria agora o menino – afastado de sua mãe – que iria trazer para casa.
A bondosa senhora começou a sua escolha, difícil, pois todos os rostinhos tristes e assustados que lhe via causavam piedade e tocavam as suas fibras maternais.
Parou afinal junto do pretinho gordo e bem tratado, que a olhava com meiguice e receio.
Os olhares de ambos se encontraram e Guilherme viu a ternura que procurava. Quando a senhora estendeu-lhe a mão, a criança perguntou:
- Minha senhora, está bem certa de que me quer? Sou pretinho!
Havia naquela vozinha um misto de meiguice, de pavor, de ansiedade e de desejo intenso de amor! Como aquelas palavras ecoaram e caíram bem no coração daquela mãe sem filho!
- Sim, meu filho, bem certa! A tua alma é tão branca como a de meus filhos! Vem! Educar-te-ei e amar-te-ei como se fosses meu!
À noite, depois de haver deitado o novo filho em sua própria cama e de haver orado com ele pelos pais que haviam ficado tão longe, a boa senhora foi dobrar as roupinhas que lhe despira. Com surpresa sentiu que havia alguma coisa no forro do paletó.
Retirando o envelope achou nele algumas notas de cem cruzeiros e o seguinte bilhete:
“Que Deus a recompense, minha senhora, e permita que no nosso Guilherme encontre um filho obediente, dócil e amoroso. Enviamos isto para as despesas do nosso querido, que entregamos nas mãos de Jesus”.
Logo enviaremos mais.
Muito gratos por sua hospitalidade e pelo carinho que der ao pequenino!
Minha esposa esquece seu sofrimento e a dor de ver partir o filho, a quem ama acima de tudo neste mundo, quando pensa que o seu sacrifício significa a salvação de uma vida que mais tarde poderá ser útil a Deus e aos homens.
Partirá amanhã para ser a mãe carinhosa de muitos que, em seus leitos de dor, estarão privados do amor materno.
Lágrimas quentes rolaram por suas faces tornadas pálidas e magras pelo sofrimento e, mesmo de longe, os dois corações maternos se entrelaçaram e se irmanaram no sentimento de amor, de dedicação e de esquecimento do seu eu.
Quando vocês se prepararem para festejar o “Dia das Mães” tenham em mente que não é apenas nesse dia especial que podem e devem lembrar-se do amor de que são cercados.
É preciso que em cada dia do ano os filhos honrem, amem e mostrem que amam as suas mamães e que se lembrem igualmente que seus papais merecem o mesmo carinho!
“Honrarás a teu pai e a tua mãe”, eis a ordem do Senhor nosso Deus.